Vamos lá. Luiz Inácio Lula da Silva voltou à sua ladainha de sempre. Haveria no país uma grande conspiração contra o PT, que uniria a “elite conservadora”, a oposição e, como sempre, a imprensa. E falou no que parece ser uma clara ameaça: “Estamos fazendo uma campanha perigosa. Se, em 2002, fizemos uma campanha da esperança contra o medo, agora é a da esperança contra o ódio”. Ora, quem faz uma consideração como essa está se preparando para o vale-tudo. É como se dissesse: “Já que o meu adversário me odeia, tudo o que fizer está justificado; afinal, eu encarno a esperança”.
Vocês conhecem a fábula do lobo e do cordeiro, não? O malvadão acusa o carneirinho de estar turvando a água que ele bebe. “Mas como, pergunta o outro, eu poderia fazê-lo se bebo morro abaixo?”. O lobo então diz que ficou sabendo que o outro falara mal dele no ano anterior. “Mas eu nem havia nascido”, objetou o interlocutor. “Então foi seu irmão.” Ocorre que o acusado não tinha irmãos. “Então foi alguém que você conhece, algum outro cordeiro, um pastor ou um dos cães que cuidam do rebanho, e é preciso que eu me vingue.” E pulou em cima do cordeiro, meteu-lhe os dentes e o matou.
Assim é Lula. Como está doido para pular na jugular dos adversários, mas quer fazê-lo na condição de vítima, não de algoz, então inventa a conspiração. Lula discursou no evento que formalizou a candidatura de Alexandre Padilha ao governo de São Paulo. E o que se viu foi o petista nos moldes pré-2002.
Ora, quem é esse senhor para falar em ódio? Não é aquele que inventou a tal “herança maldita”, que nunca existiu? Não é aquele que transforma seus adversários na fonte de todo mal, incapaz que é de lhes reconhecer uma única virtude? Procurem os discursos de FHC, por exemplo, e se encontrarão vários elogios a Lula — alguns, a meu juízo, absolutamente imerecidos. Mas o Lulinha, que supostamente não odeia ninguém, ah, esse é incapaz de admitir que seus adversários possam ter feito, alguma vez, algo de bom. Ele muda de ideia, sim, desde que o antigo desafeto se ajoelhe a seus pés, como faz José Sarney.
No melhor do seu estilo rancoroso, sugeriu que FHC não aprendeu a ter sentimentos na “faculdade”. Entenderam? Para Lula, estudo e o preparo intelectual tornam as pessoas insensíveis. Mas ele tem a certeza de que os outros odeiam, e ele ama.
Incrível, não, leitores? Como não me lembrar do tal “Ultrajano” neste momento? Do que foi que ele me acusou mesmo? Lembrei! De disseminar o ódio. E ele fez o quê? Demonizou a mim e a meus leitores num canal de televisão. E tudo por quê? Ora, porque ele é um homem amoroso, certo? Reparem: ainda que em escalas distintas, o procedimento é o mesmo: acusam os outros de fazer aquilo que eles próprios fazem; desumanizam as suas vítimas para que possam, então, avançar em seu pescoço. É uma gente moralmente asquerosa.
Lula foi adiante nas tolices. Repetiu um mantra da época do mensalão, afirmando que estavam tentando fazer com ele o que fizeram com Getúlio Vargas. Esperem. O que foi que fizeram com Getúlio? Que eu saiba, gente da laia getulista tentou matar Carlos Lacerda, não é? Descoberta a trama, o então presidente se matou. Que se saiba, não foi Lacerda quem puxou o gatilho.
Lula é doido para se apropriar da obra alheia — como tenta fazer com o Plano Real, que ele buscou destruir — e para se livrar dos seus pecados. Referiu-se à vaia que Dilma levou no Itaquerão. Segundo disse, quem xingou a presidente não tem “calo na mão” “porque aquelas pessoas tinham cara de tudo, menos cara de trabalhadores”. Ele está tentando se livrar do peso da Copa do Mundo. Quem conduziu todo o processo foi o PT. Ainda que fosse verdade que não havia trabalhadores no estádio, os responsáveis são Lula, Dilma e seu partido, não é mesmo? Que eu me lembre, quando os tucanos se negaram a pôr dinheiro público em estádio, foram duramente criticados pelos… petistas!
Quanto a calo na mão, dizer o quê? Lula não sabe o que é isso desde os 27 anos, quando virou diretor de sindicato. Está com 68. Não vê um calo de perto há 42 anos. No máximo, pode ter calo na língua, de tanto falar bobagem.
Por Reinaldo Azevedo/Veja