Um relatório da Polícia Federal apontou que ex-integrantes da cúpula da Segurança Pública e do Ministério Público da Bahia interferiram em investigações para beneficiar desembargadores alvos da Operação Faroeste, que mira no esquema de venda de decisões judiciais no Brasil. As informações são do jornal Folha de S. Paulo.
O principal nome mencionado no relatório é o ex-secretário da SSP-BA, Maurício Teles Barbosa, que comandou a pasta de 2011 a 2020. O documento, assinado pelo delegado federal Pancho Riva Gomes em 31 de julho, aponta os investigados como suspeitos de participar de organização criminosa e de outras irregularidades, segundo a Folha.
As informações partiram de quebras de sigilo, delações premiadas, incluindo a desembargadora Sandra Inês Rusciolelli, e depoimentos de pessoas que trabalharam com o ex-secretário.
Barbosa foi exonerado em 2020 em meio às investigações da Operação Faroeste após o Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinar seu afastado do cargo por um ano e autorizar duas novas fases da Operação. O STJ ainda vai julgar se aceita a denúncia contra ele.
Atuação
Ainda segundo o relatório da PF que a Folha teve acesso, Barbosa é suspeito de atuar em favor de um grupo de desembargadores ligado a Adailton Maturino, conhecido como “falso cônsul” da Guiné-Bissau. Ele é suspeito de ter bancado decisões favoráveis de desembargadores em um esquema de grilagem no oeste da Bahia. Em 2018, Maurício Barbosa deu a Maturino a homenagem de “amigo da PM”.
Os desembargadores ligados a Maturino costumavam acionar a alta cúpula da Segurança para que fossem criadas operações policiais contra o grupo que disputava terras com o falso cônsul. O delegado Jorge Figueiredo, ex-titular do Departamento de Repressão ao Crime Organizado (Draco) contou em depoimento que a justificativa dada para promover a Operação Oeste Legal era de que se tratava de uma organização criminosa que grilava terras. Ele revelou ainda que participou de uma reunião com a desembargadora Maria do Socorro Barreto Santiago, então presidente do TJ, e uma das pessoas ligadas a Maturino.
Figueiredo contou também que Maurício Barbosa não estava satisfeito com as investigações, pois ele não solicitou a prisão dos alvos e pediu apenas buscas e apreensões. Ele então foi exonerado.
Ainda de acordo com o relatório da PF, Barbosa pediu outra operação, chamada Fake News, contra pessoas que elaboraram um panfleto que falava sobre a relação de Adailton Maturino com os desembargadores. Posteriormente as duas operações foram arquivadas.
Relação com o Ministério Público
Em 2016, o Grupo de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público da Bahia deflagrou uma operação chamada Immobilis. Os alvos eram Adailton Maturino e sua esposa, Geciane.
No entanto, o falso cônsul já sabia da operação e ligou para a desembargadora Maria do Socorro, para outro desembargador e para um homem de confiança de Maurício Barbosa na noite anterior à Immobilis, segundo publicou a Folha. Maturino então fugiu e, em seguida, conseguiu um habeas corpus.
Vinte dias antes da operação, a chefe de gabinete de Barbosa, Gabriela Macedo, pediu informações sobre a investigação sigilosa para Ediene Lousado, então chefe do Ministério Público, que revelou também sobre uma interceptação telefônica contra Maturino. Ela ainda tentou abrir uma apuração contra um promotor que atuava na Operação Faroeste.
Procurado pela Folha, o advogado de Maurício Barbosa, Sérgio Habib, disse que não tem conhecimento do relatório, mas que as acusações “não têm a menor procedência”. Habib acrescentou que o ex-secretário “à época não tinha qualquer atuação e interferência nesses inquéritos” e que voltou ao cargo na Polícia Federal por decisão do próprio STJ.
Maurício Barbosa disse, em depoimento à PF, que sua relação com a desembargadora Maria do Socorro e a procuradora Ediene Lousado era meramente institucional. Ele negou ter mantido contato com Adailton Maturino e que não interferiu em investigações da Polícia Civil. Sobre a exoneração do delegado Figueiredo do Draco, alegou que ele tinha o desempenho insatisfatório.
A Folha procurou a defesa de Ediene Lousado, que não se manifestou, e não localizou a defesa de Gabriela Macedo. Lousado também disse à PF que sua relação com Barbosa era institucional.