Ao investigar o esquema de corrupção e grilagem envolvendo a cúpula do Judiciário na Bahia, a Operação Faroeste esbarrou em algo mais pitoresco: um sistema de monitoramento ilegal controlado pelo delegado federal Maurício Teles Barbosa, que foi secretário de Segurança Pública dos petistas Jaques Wagner e Rui Costa.
Barbosa foi denunciado pela subprocuradora-geral Lindôra Araújo, em julho, com mais 15 investigados, entre desembargadores, juízes, advogados e uma promotora. Na denúncia, obtida por O Antagonista, ela acusa o delegado da PF de tentar “impedir e embaraçar” as investigações.
“Para isso, utilizava-se de maneira ilícita, do controle das interceptações telefônicas que detinha através da Superintendência de Inteligência da SSP/BA.”
Segundo a acusação, Maurício Barbosa tinha controle sobre “todas as investigações criminais sigilosas produzidas pela Polícia Civil da Bahia, bem como suas operações, com antecipação de investigações, manipulação de dados obtidos no bojo de interceptação telefônica, conhecimento prévio de quebra de sigilo bancário e fiscal, com situações de vazamento desses conteúdos“.
O esquema teria sido implementado ainda em 2011, quando foi nomeado por Wagner, ampliado no governo de Costa, a partir de 2016, e durado até sua exoneração em dezembro de 2020, ao virar alvo da Faroeste.
A investigação da PGR descobriu que Barbosa se tornou um homem poderoso e rico na Bahia, firmando parceria com o Tribunal de Justiça, na gestão do desembargador Gesivaldo Britto, também nomeado por Jaques Wagner. No TJ-BA, segundo a denúncia, eles teriam montado um “gabinete” especializado em grampear desembargadores e achacá-los.
A Faroeste desbaratou uma intricada organização criminosa especializada em grilar extensas áreas de terra no oeste da Bahia. Esses terrenos viravam alvo de disputa judicial e “regularizados” em nome dos beneficiários do grupo, justamente pelas mãos de juízes e desembargadores.
O esquema de grilagem, ainda de acordo com a denúncia, era comandado pelo empresário Adailton Maturino, com a participação dos desembargadores Gesivaldo Britto e Maria do Socorro — que também presidiu a Corte estadual e foi nomeada para do TJ por Wagner.
Segundo delatores da operação, Barbosa serviu ao grupo “como braço armado e instrumento de coação e coerção”. Ele integrava o núcleo de contrainteligência da Orcrim, assim como sua chefe de gabinete, a delegada Gabriela Macedo; o então superintendente de Inteligência, Rogério Magno de Almeida Medeiros, e a Procuradora-Geral, Ediene Lousado, nomeada por Rui Costa.
Em gravação anexada aos autos, a desembargadora Sandra Inês, que virou delatora, diz que Barbosa “é daquele que faz a ‘grampologia’ todinha. E depois faz chantagem com as pessoas”. Segundo ela, o então secretário de Segurança teria “meio tribunal” grampeado. “Eles são terríveis. Aí eles botam grampo na (inaudível), em todas as pessoas que eles conhecem. Maurício Barbosa tá com meio tribunal (inaudível).”
PATRIMÔNIO INJUSTIFICADO
Além dos grampos, Barbosa é acusado pela PGR de controlar empresas de segurança privada, de forma oculta, e ostentar patrimônio incompatível com seu salário oficial.
Na denúncia, Lindôra diz que o ex-secretário “acumulou patrimônio imobiliário na capital baiana e no litoral norte, dois automóveis de luxo, quais sejam a BMW X6 e a BMW 320i, além de seis armas de fogo registradas em seu nome, sendo três delas pistolas Glock112”.
Durante busca e apreensão realizada na residência de Barbosa, em um condomínio de luxo na Costa do Sauípe, a PF apreendeu também “notas fiscais de bens de alto valor adquiridos em curto espaço de tempo e à vista”.
“As notas fiscais apreendidas demonstram que foi gasto o montante de R$ 218.000,00, em aproximadamente três meses, nos seguintes dias: a) no dia 11/06/2020 foram pagos R$ 83.000,00; b) no dia 03/07/2020 foram pagos R$ 65.000,00; c) no dia 17/09/2020 foram pagos R$ 70.000,00.114.”
CAPITÃO ADRIANO E MORO
Antes de ser exonerado do cargo por causa da Faroeste, Maurício Barbosa teve destaque no noticiário nacional por ter comandado a operação que executou o miliciano Adriano da Nóbrega, em fevereiro de 2020, numa fazenda em Esplanada (Bahia).
Investigado por relação com o Escritório do Crime, Capitão Adriano era velho amigo do ex-PM Fabrício Queiroz, considerado pelo MP do Rio o operador do esquema de rachadinha dos gabinetes da família Bolsonaro.
Um mês antes da morte de Adriano, Maurício Barbosa se reuniu com Jair Bolsonaro, em Brasília, para cobrar o desmembramento do Ministério da Justiça e da Segurança Pública, então comandado por Sergio Moro. O delegado também presidia o Consesp (Conselho Nacional de Secretários de Segurança Pública).
Com cursos de inteligência na Abin, na PF e até em Israel, o nome de Barbosa chegou a ser cotado para o lugar de José Eduardo Cardozo, que deixou o Ministério da Justiça, em 2016, por pressão do PT, que cobrava controle sobre a Lava Jato. Na ocasião, Jaques Wagner era o ministro da Casa Civil. O plano só não foi adiante por causa do impeachment de Dilma.
Fonte: O Antagonista