Morto com pauladas na cabeça na madrugada desse sábado (22), em Itabela, no Extremo Sul do estado, o menino de 11 anos que tinha corpo franzino e cabelo loiro de tintura “tocava o terror” no bairro Dapezão, onde morava com os pais.
Segundo a polícia, Paulo Henrique da Paz Silva já tinha até apelido: PH do Dapezão. Dessa forma ele se apresentava a qualquer pessoa e ostentava, sempre que podia, uma arma (revólver 32 e pistola), com o qual já foi apreendido por mais de uma vez.
A polícia diz não saber com que idade o menino começou no crime, mas que já tinha diversas passagens na delegacia de Itabela por roubo, assalto e participação em homicídio. Mas por ser criança, nenhuma autoridade pode tomar providências.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei nº 8.069 de 13 de julho de 1990, diz que menores de 12 anos são considerados crianças e são inimputáveis penalmente, ou seja, não podem sofrer nenhum tipo de penalidade.
As medidas socioeducativas como a internação podem ser aplicadas apenas para adolescentes, com idades entre 12 e 17 anos.
“O juiz da Vara da Infância até quis interná-lo, mas seria contra a lei, e em Itabela não tem abrigo. Ele não pode ser considerado nem como menor infrator”, disse o delegado Marivaldo Felipe dos Santos ao CORREIO.
Cabia aos pais, conforme o delegado, tomar providências, mas isso não foi feito e nem nunca eles foram punidos. Nenhum dos responsáveis pela criança foi localizado pela reportagem.
O menino não chegou a passar pelo Conselho Tutelar, o que ocorreria somente se ele fosse vítima de crimes.
Medidas
No ECA, ato infracional praticado por criança tem como medidas o encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; a orientação, apoio e acompanhamento temporários; a matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental, dentre outras.
Há previsão ainda pelo ECA de a criança ser colocada em instituição ou casa de abrigo, ou ainda de a família perder a guarda. Mas em Itabela, cidade de 30 mil habitantes, não existe local onde PH pudesse ficar.
O CORREIO não conseguiu contato com a Prefeitura de Itabela para saber se foi dado acompanhamento à família e ao menino em algum órgão local.
Fora da escola, o garoto era envolvido com um grupo de adolescentes e adultos com idade entre 13 e 20 anos, com os quais praticava os crimes, sobretudo assaltos.
“PH chegava em estabelecimentos com amigos e tocava o terror”, afirmou o delegado. “Parecia que comandava a ação criminosa”.
Colegas mortos
Mas o envolvimento do grupo com o tráfico de drogas chamou a atenção de grupos rivais locais. Na noite do dia 6 de dezembro, PH e mais quatro amigos caminhavam numa rua do Dapezão, quando foram alvos de atiradores.
Todos correram, mas um deles, Darles Santos Marinho, 19, foi baleado. Ele ainda correu para uma plantação de café próxima, nas não resistiu aos ferimentos.
Segundo a polícia, Darles não tinha passagens por crimes, mas era envolvido com a turma de PH, que depois desse crime passou a ser caçado, assim como os demais amigos que estavam no dia que Darles foi morto.
Adenivan Grigório da Silva, 15, não precisou sair de casa para ser morto. Seus algozes foram buscá-lo no último dia 9 na residência onde morava com os pais, no centro da cidade, e o levaram para um matagal. Lá, o executaram com 15 tiros. Um dia antes o adolescente tinha prestado queixa na polícia contra os criminosos.
PH seria o próximo. Visto de bobeira numa festa de som de paredão, no bairro Bandeirantes, acabou sendo morto com golpes de um porrete de madeira que tinha quase o seu tamanho.
“Pelo que tivemos de informação, tem mais dois na lista para morrer”, disse o delegado Marivaldo Felipe, que atua nas delegacias de Itabela e Eunápolis.
“São pequenos grupos de criminosos que se rivalizam na cidade e passaram a ter esses jovens como alvo. Os autores dos crimes já foram identificados e estamos atrás deles”, afirmou o delegado.
Destaque em homicídios
Itabela, apesar de ser uma cidade de pequeno porte, possui casos de homicídios que a colocam em destaque, comparando com outras cidades do mesmo perfil na região.
Em 2017 foram registrados 26 homicídios, metade da vizinha Eunápolis, que tem quase quatro vezes a população de Itabela e registrou 56 crimes do mesmo tipo. Em 2016, foi pior: Itabela teve 40 homicídios dolosos registrados pela Secretaria da Segurança Pública (SSP-BA).
Segundo a Polícia Civil, três facções atuam na cidade: a Baixada (local), a Mercado do Povo Atitude (MPA), que é de Porto Seguro e tem ligação com a facção paulista Primeiro Comando da Capital (PCC), e o Primeiro Comando de Eunápolis (PCE). A polícia não conseguiu identificar se PH e os colegas pertenciam a alguma facção.
O histórico de crimes em Itabela, contudo, não é de agora. A cidade com 29 anos de emancipada e cruzada pela BR-101 se desenvolveu a partir de um polo madeireiro que gerou disputas por áreas de florestas no entorno do Monte Pascoal e atraiu também pistoleiros.
Durante a década de 1970, Itabela abrigou o “Sindicato do Crime”, uma organização criminosa composta por pistoleiros que matavam sob encomenda e era comandada por um fazendeiro local que acabou sendo morto por um dos seus comandados.
Economicamente, hoje, Itabela é destaque na produção de mamão na Bahia e tem milhares de hectares plantados com eucaliptos para produção de celulose na fábrica da empresa Veracel, sediada em Eunápolis.
A cidade possui PIB per capta de R$ 10.596, segundo dados de 2016 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na pesquisa Firjam de Desenvolvimento Municipal de 2018, a cidade foi avaliada com desenvolvimento regular.
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