O ex-prefeito de Salvador, João Henrique Barradas Carneiro e o ex-secretário de Educação, Cultura, Lazer e Turismo (Secult), João Carlos Bacelar Batista, terão que devolver – de forma solidária – aos cofres municipais, um total de R$ 47,7 milhões em razões de irregularidades e desvio de recursos em convênios celebrados com a ONG Fundação Pierre Bourdieu, nos anos de 2011 e 2012. Cada um deles terá que pagar, ainda, uma multa de R$50 mil. A decisão é do Tribunal de Contas dos Municípios, que julgou na sessão desta terça-feira (20/04), por meio eletrônico, relatório de auditoria realizada sobre os quatro convênios que foram celebrados pela prefeitura com a fundação, envolvendo um total de R$ 115 milhões.
O conselheiro José Alfredo Rocha Dias, que relatou o processo de análise da auditoria, em seu voto – aprovado à unanimidade – determinou a formulação de representação ao Ministério Público Estadual contra os gestores, de forma que possa o MPE avaliar a utilização dessas conclusões em ação civil de improbidade administrativa já ajuizada. Será encaminhada, ainda, cópia do processo à Polícia Federal e Polícia Civil do Estado da Bahia – que investigou o caso na Operação “Prometeus” – para informação e eventuais ações.
A auditoria foi instaurada pelo TCM diante da constatação de que os repasses oriundos dos convênios celebrados com a ONG apresentavam significativas diferenças entre os montantes declarados no Sistema SIGA, do tribunal, e os valores constantes da documentação que compunha as prestações de contas. Isto porque, embora a soma dos recursos previstos para a execução dos quatro convênios fosse da ordem de R$115.964.476,93, foram encaminhados para análise do tribunal documentos relativos ao emprego de apenas R$33.913.135,99.
O relatório elaborado pelos auditores do TCM apontou a existência de diversas irregularidades e vícios na celebração e execução dos convênios, “além da patente falha e precariedade das prestações de contas”. Destacaram que a celebração dos convênios ocorreu de forma irregular, sobretudo, “pelo direcionamento na escolha da referida ONG para formalização dos convênios de cooperação técnica, pela terceirização indevida de mão de obra, pela falta de detalhamento no Termo de Convênio e no Plano de Trabalho, pela falta de especificação das despesas a serem executadas para o desenvolvimento dos projetos e pela ausência de documentos obrigatórios”.
Também chamou a atenção da equipe de auditoria a falta de acompanhamento e fiscalização da execução dos convênios por parte da Secult e, também, pela Controladoria Geral do Município, especialmente em razão da constatação da utilização dos recursos “em desacordo com o plano de trabalho, uso das verbas de um convênio em objeto de outro, falta de apresentação de prestação de contas nos prazos estabelecidos, desvio de finalidade na contratação de pessoal e, finalmente, pelas práticas atentatórias aos princípios fundamentais da Administração Pública nas contratações, na realização de pseudos processos licitatórios”.
Para o conselheiro José Alfredo, o relatório elaborado pelos técnicos do TCM, não só identifica uma série de irregularidades de natureza formal e inobservância a regramentos próprios nos processos de repasse dos recursos e suas respectivas prestações de contas, “como também aponta graves desvios e uso indevido das verbas”. Afirmou também que, embora os convênios – ao menos em teoria – tivessem por objeto a “modernização da gestão educacional”, serviram exclusivamente para a contratação de pessoal para os diversos setores da Secretaria de Educação e dos Centros Municipais de Educação Infantil – CMEI.
Sobre esse ponto, o documento revela que, entre os meses de junho e dezembro de 2012, foram contratados, em média, 1.382 profissionais para as atividades de “Analista, Coordenador de Recursos Humanos, Coordenador de Departamento Pessoal, Assistente Didático-pedagógico, Assistente A, Auxiliar de Desenvolvimento Infantil, Auxiliar de Secretaria, Auxiliar de Serviços Gerais, Auxiliar de Apoio, Assistente de Manutenção, Motorista e Porteiro”.
O relatório destacou as seguintes ilegalidades: “Direcionamento na escolha do convenente para formalização dos instrumentos de cooperação técnica; utilização incorreta do instrumento de convênio para a realização de cooperação técnica com uma Organização não Governamental; ausência de documento comprobatório de notificação à Câmara Municipal relativo às celebrações dos Convênios; ausência de documentos obrigatórios à celebração dos convênios; fraudes na documentação fiscal na ordem de R$14.289.458,81; comprovantes de despesas apresentados com irregularidades na Autorização para Impressão de Documentos Fiscais – AIDF; e contratação de pessoal, mesmo após a denúncia do convênio”.
Foram apontadas ainda, como irregularidades, a “transferência de recursos financeiros à entidade, efetivada após a denúncia do convênio; ausência de parecer técnico e de ação fiscalizadora por parte da SECULT na execução dos convênios; ausência de documentos essenciais para a composição das prestações de contas; realização de despesas em desacordo com o previsto nos planos de trabalho; divergência entre as informações constantes no CNPJ e em Notas Fiscais emitidas pelas empresas; ausência de comprovação de despesas no montante de R$12.934.741,11; terceirização irregular de mão de obra no montante de R$26.819.611,39; desvio de função dos prestadores de serviços; recibos de pagamento dos prestadores de serviços autônomos com dados incompletos; burla à modalidade de procedimento licitatório; ausência de segregação de funções na Coordenação e na Fiscalização dos Convênios; utilização de recursos financeiros de um convênio para realização de despesas atinentes a outro; ausência de parecer do controle interno; uso indevido de “verba indenizatória” para pagamento de pessoal contratado pela ONG; e, por fim, a não apresentação ao TCM de prestações de contas correspondentes ao montante dos valores efetivamente repassados à ONG”.
O Ministério Público de Contas, através do procurador Danilo Diamantino, opinou pelo conhecimento e procedência das conclusões da auditoria, sugerindo a aplicação de multa e a penalidade de ressarcimento com recursos próprios dos dois gestores, do valor de R$47.728.542,43. Recomendou, ainda, a formulação de representação ao Ministério Público Estadual “para apurar eventuais atos enquadrados com crime ou improbidade administrativa”.
Cabe recurso da decisão