Flávio Oliveira, 28 anos, órfão de pai e mãe, herdeiro de uma das maiores fortunas da axé music, ingressou com uma ação judicial que revela mais uma história sórdida e repugnante ocorrida nos bastidores da música baiana.
Tudo começou em 1995, quando o grupo empresarial Cheiro de Amor era composto por três sócios com cotas iguais – Wilton Clóvis, Windson Silva e Manoel Castro. Os dois primeiros (Wilton e Windson) são irmãos.
Acontece que, no dia 16 de abril de 1995, Wilton Clóvis morreu em acidente de carro, com grande repercussão na imprensa baiana, não só pela sua influência no mundo do axé, mas por ter falecido justamente no dia do aniversário de seu único filho – Flávio Oliveira.
Wilton Clóvis vinha de um show de madrugada para comemorar o aniversário de sete anos do menino, dormiu ao volante e morreu afogado num lago após capotamento. O garoto, que havia perdido a mãe havia três anos, tornou-se órfão no dia do seu aniversário. Órfão e herdeiro universal de uma fortuna.
O Inventariante e a Tutora
Acontece que, quatro dias após a morte de Wilton Clóvis, os dois sócios – Windson Silva e Manoel Castro – se uniram a Maria Auxiliadora (irmã de Windson e tia de Flávio), para um verdadeiro golpe no grupo Cheiro de Amor.
O trio abriu empresas com nomes e objetos similares às que existiam, e transferiram todo o patrimônio que estava nas sociedades que constavam o nome de Wilton Clóvis, patrimônio este que, obviamente, seria herdado pelo seu filho órfão.
Resumindo: as empresas anteriores à morte de Wilton Clóvis pararam de faturar e todas as atividades econômicas passaram a ser exercidas pelas novas sociedades empresariais, criadas pelo trio Windson Silva, Manuel Castro e Maria Auxiliadora.
Para obter êxito nessa tramoia, Windson Silva atuou como inventariante do espólio do irmão Wilton Clóvis, enquanto a sua irmã Maria Auxiliadora tornou-se tutora do garoto órfão de pai e mãe.
A Sogra
Passados 20 anos, Flávio Oliveira descobriu toda a sujeira e moveu as ações judiciais com robustas provas do assalto que sofreu nessas duas décadas. Os autos processuais contêm documentos contundentes obtidos junto à Juceb, Detran, INPI e cartórios.
Nessa documentação, que a Revista Bahia teve acesso, está a prova de que no dia 26/05/1995, um mês e dez dias depois da morte de Wilton, os sócios e Maria Auxiliadora entraram com nove processos iguais de registro da marca Cheiro de Amor, no INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial).
A marca Cheiro de Amor pertencia a uma sociedade empresarial que seria herdada pelo órfão Flávio Oliveira. Como ela passaria por avaliação judicial no inventário, eles decidiram não tirar a marca, mas passaram a usá-la também nas novas empresas abertas às pressas.
Na mesma época, os imóveis e móveis, inclusive todos os caminhões, foram transferidos a “laranjas” e outras empresas recém-abertas. Na documentação, há transferência até para a sogra de Windson Silva, uma senhora idosa, que também participou de outras negociatas.
A Mansão
A Mansão da Barra, antiga sede do Cheiro de Amor, hoje uma das filiais da Alpha Fitness – academia que pertence atualmente ao grupo –, foi outro objeto dos golpes contra o órfão. O imóvel era de propriedade dos três sócios em quotas iguais.
Enquanto inventariante do espólio do irmão, Windson alegou que o órfão não dispunha de quantia líquida (dinheiro vivo) para quitar as despesas do inventário e conseguiu que “terceiros” comprassem a Mansão da Barra.
Ora, o órfão não possuía quantia líquida para custear o inventário porque parou de receber os dividendos da atividade empresarial do Cheiro de Amor, justamente em razão de as atividades econômicas não mais lhe pertencerem, visto que os sócios do seu pai e a sua tia transferiram os rendimentos do grupo para outras empresas.
A verdade é que a Mansão da Barra foi vendida a “terceiros”, mas, na verdade, foram os sócios (representados por “laranjas”, inclusive a sogra de Windson) que compraram o imóvel. E mais um detalhe sórdido: em 2003, o imóvel foi doado aos filhos de Windson.
Durante todo este tempo de efervescência da música baiana, Flávio Oliveira recebeu mensalmente um valor fixo, invariável, de R$ 3.000,00 (três mil reais), que foi suspenso após o ingresso das ações judiciais. Uma pensão ridícula, que, ressalte-se, lembra o famigerado caso do Cacique Jone, do Chiclete com Banana.
A riqueza de detalhes dos golpes sofridos pelo órfão do Cheiro de Amor está na série de reportagens intitulada “O axé music fede”, do colunista Marconi de Souza que será publicada pela Revista Bahia a partir da próxima semana, dando amplo direito de defesa e do contraditório aos sócios da empresa.
Por: Marconi de Souza Reis
Colunista Revista Bahia Acontece
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